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quinta-feira, 2 de maio de 2013

Sobre as conversações entre o Governo e a RENAMO

INTRÓITO: as conversações que estão em curso (vão já na segunda ronda) entre uma delegação do Governo, chefiada pelo ministro da Agricultura, José Pacheco, e da RENAMO, chefiada pelo respectivo secretário-geral, Manuel Bissopo, tornam pertinente clarificar o quadro em que se desenrolam, tanto para dissiparmos alguns equívocos persistentes  como para evitar, tanto quanto possível, que  outros se suscitem.
Maputo, Quinta-Feira, 2 de Maio de 2013:: Notícias
DA VIGÊNCIA OU NÃO DO AGP
O primeiro equívoco é a insistência da RENAMO de que o diálogo/conversações/negociações devem ter por objecto questões da implementação do AGP, ou mesmo de renegociação do AGP. E não se trata de equívoco apenas da RENAMO. Creio mesmo que tem arrastado alguns incautos a alinhar pelo mesmo diapasão.
Nas palavras recentes de Raul Domingos, chefe da delegação da RENAMO em Roma, e que não tenho por incauto, na “Grande Entrevista” na edição de “O País” de 24/4/13, podemos encontrar aquilo que considero a origem deste equívoco. À certa altura, e depois de reconhecer que a “a paz é um processo”, afirma que “se analisarmos aquilo que é a gestão do processo de paz, ou seja, do acordo de paz”, e mais, «...sinto que o processo não está a seguir os passos certos e que a gestão deste acordo e desta paz tem encontrado ao longo do tempo algumas dificuldades.”
Nestes pronunciamentos confunde-se, deliberadamente ou não, “gestão da paz” e “gestão do acordo (AGP)”, como se fossem uma e a mesma coisa. Ora, a gestão do AGP fez-se, exclusivamente, nos termos previstos no próprio Acordo. O Cap. II do Protocolo V, Das Garantias, estabeleceu, com a criação da Comissão de Supervisão e Controlo, CSC, um quadro bem definido para a sua interpretação, fiscalização e controlo da respectiva implementação. Esta Comissão era composta por representantes do Governo, da RENAMO, das Nações Unidas e da OUA. Era presidida pela ONU e tinha a sede em Maputo. Nos termos do Acordo, “as decisões da CSC serão tomadas por consenso de ambas as partes”, isto é, do Governo e da RENAMO. O que significa que a responsabilidade das decisões, de todas as decisões, era exclusivamente do Governo e da RENAMO. As Nações Unidas e a OUA não se substituíam às partes. Estavam lá para garantir equilíbrio, transparência e imparcialidade na implementação e respeito pelo acordado.
Portanto, “a gestão do AGP” foi feita exclusivamente por esta Comissão, a qual, nos termos do próprio AGP, cessou as suas funções com a tomada de posse do Governo saído das eleições de 1994.
Mas quanto à “gestão da paz”, este é um outro conceito, correspondente a uma outra realidade. Com efeito, a “gestão da paz” corresponde ao período post-implementação do AGP e não se desenvolve no quadro bipartido ou multilateral, determinado no Acordo para a gestão do Acordo, mas num quadro mais amplo em que são partes todas as instituições e todos os cidadãos moçambicanos. E qual é esse quadro? É justamente o quadro da Constituição, Constituição na qual o AGP, nos termos determinados pelo mesmo, foi incorporado, tal como reconhece Raul Domingos, na “Grande Entrevista”.
Com efeito, o Cap. IV do Protocolo V, Das Garantias, estabelecia, in fine,  que “(...) o Governo da República de Moçambique submeterá à Assembleia da República, para adopção, os instrumentos legais incorporando os Protocolos, as garantias, assim como o Acordo Geral de Paz, na lei moçambicana”. Durante as negociações, esta questão foi colocada, e imposta, como condição e garantia do AGP, para se conferir não só legalidade ao Acordo, como também supremacia, em tanto que lei posterior, sobre as demais leis, completando-se assim o que o n.° 1 do Protocolo I, Dos Princípios Fundamentais, já determinava, no sentido de que o Governo se comprometia “(...) a não adoptar leis ou medidas, e a não aplicar as leis vigentes que eventualmente contrariem...” o AGP. E isto foi estritamente cumprido.
Daqui decorre também a falsidade da suscitada e recorrente questão sobre a vigência ou não do AGP. Raul Domingos diz que “(...) começamos a notar sinais de perigo quando algumas vozes se levantam e dizem que o AGP já morreu ou é caduco” . A questão é colocada como se alguém, de má-fé, quisesse decretar ou tivesse decretado unilateralmente a revogação do AGP, ou declarado a sua cessação. Porém, nada mais equivocado.
É que o processo de implementação do AGP cessou formalmente com a tomada de posse do Governo saído das eleições de 1994. Daí que o instrumento dessa implementação, a Comissão de Supervisão e Controlo, tivesse também cessado na mesma altura. Ninguém decretou ou declarou essa cessação: o próprio AGP assim o determinava, expressamente, no n.° 6 do Cap. II do Protocolo V, Das Garantias, nos seguintes termos : “A CSC cessará as suas funções com a tomada de posse do novo Governo”.
Portanto, se o AGP, hoje, está vivo, ele vive nos resultados, nos frutos que produziu: a paz e a normalização da vida dos moçambicanos, assim como os Acordos de Lusaka vivem na independência de Moçambique que permitiram proclamar. Porém, a vida do país e dos moçambicanos não se rege, hoje, pelos Acordos de Lusaka, mas sim pela Constituição da República.Mutatis mutandi”, o mesmo vale para o AGP.
É assim que a gestão da independência do país é uma questão de todos os moçambicanos e tem como único quadro de referência a Constituição e as leis da República. O mesmo vale para a gestão da paz (e não já do AGP): trata-se de uma questão fundamental de todos os moçambicanos e tem como único quadro de referência a Constituição e as leis da República.
Para concluirmos que as conversações em curso não se fazem no quadro do AGP nem podem ter por objecto o AGP. Elas podem ter por objecto a gestão da paz, mas sempre por referência ao quadro constitucional, único que legitima quer o Governo, quer a RENAMO, quer qualquer outro partido, força política, instituição ou cidadãos que a ele sejam chamados ou nele participem.
Irei ainda mais longe: mesmo porventura admitindo que haja questões decorrentes de incumprimentos do clausulado no AGP, elas teriam de ser colocadas e analisadas no quadro da Constituição e das leis, e nunca no do AGP. Sob pena de se ter de restabelecer a CSC, único instrumento criado pelo AGP para dirimir litígios decorrentes da sua implementação ( alínea do n.° 5, do Cap. II, do Protocolo V, Das Garantias), o que é evidentemente um absurdo.
Portanto, e nesta perspectiva, a agenda do diálogo ou das conversações parece-me completamente aberta.
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