Respira-se o caos e a incapacidade
Doentes
internados com patologias diferentes partilham a mesma sala. Alguns
estão internados “no chão”… Mas o director Clínico do HCM, Domingos
Diogo, diz que é um dos melhores hospitais da África Austra
Maputo
(Canalmoz) – O Hospital Central de Maputo (HCM) “abriu” parcialmente as
portas aos órgãos de comunicação social para mostrar o seu
funcionamento mas não mostraram à Imprensa os departamentos polémicos,
como são os casos da morgue e salas de raio X.
No que é o maior centro hospitalar do País há mais problemas do que coisas boas para mostrar.
O
caos vai desde doentes internados no chão a outros misturados com tantos
outros com patologias diferentes. É normal um doente que sofre de
tuberculose estar internado na mesma sala com um outro doente que está
internado, por exemplo, vítima de um baleamento.
Segundo
a direcção do hospital que mais do que ninguém domina questões ligadas à
saúde, a ideia é: “se houver cama vazia num quarto, metemos um doente
internado”. É a fórmula que se encontrou para resolver o problema da
falta de camas.
No Serviço de Urgências as reclamações de demora no atendimento são a marca registada dos utentes.
Tal
como fizemos referência, não tivemos acesso à morgue. Mas as conversas
que se desenvolvem entre doentes, funcionários e de pessoas que já
tiveram acesso ao local são de arrepiar os cabelos. Aliás, está a
circular um vídeo, gravado por um indivíduo que ia à procura do corpo do
seu familiar na morgue, que retrata fielmente o tratamento mais
precário que se dá aos cadáveres. O horror tem uma explicação. Aqueles
serviços foram concebidos para pouco mais de uma dezena de corpos. Mas
actualmente chegam a entrar naquele serviço mais de 30 corpos
simultaneamente. Resultado: alguns ficam à espera no chão.
Segundo
nos foi informado por funcionários daqueles serviços, é preciso fazer
lobbies de cunho corrupto para não encontrar um ente querido
“conservado” no chão e vulnerável ao “vira-te para cá e vira-te para
lá”, quando um familiar estiver para identificar o corpo do seu próximo.
A
direcção do Hospital reconhece todos os problemas mas estranhamente não
há solução para muitos. Há sim, na linguagem dos gestores do mesmo,
“paliativos”. O director Clínico do HCM diz que as reclamações em
relação ao funcionamento estão ligadas à relação enfermeiro/médico e o
doente. Diz que há questões graves, mas que já estão a ser resolvidas na
relação entre os profissionais de saúde e doentes. “Estamos a trabalhar
na humanização dos serviços de saúde, principalmente na relação entre
os profissionais e doentes. É aqui onde há muitos problemas”.
Em
relação à Morgue, o Dr. Fiogo diz que apesar de estar no recinto do
Hospital Central de Maputo, os serviços de morgue estão sob alçada do
Conselho Municipal de Maputo (CMCM).
“De
facto os serviços já não aguentam a demanda. Estivemos lá a fazer o
trabalho de levantamento e constatámos que a procura duplica a real
capacidade dos serviços”, disse.
Os “troféus” que não colhem consenso
Há
muito que se reclama a qualidade das refeições servidas no HCM. Mas o
director prefere não falar da qualidade, antes, sim, da quantidade. Diz
que o problema de alimentação no HCM já foi resolvido. Ninguém reclama
fome porque são servidas quatro refeições diárias, nomeadamente:
mata-bicho, almoço, lanche e jantar. “Resolvemos o problema de comida”,
disse para depois revelar que o Hospital Central de Maputo é um dos
melhores da África Austral.
Mapa de índice de satisfação suspeito
Em
vários departamentos que visitámos encontramos um mapa afixado nas
paredes, dando conta do índice de satisfação dos utentes em relação aos
serviços prestados. Os números não deixam de ser curiosos. Mais de 90
porcento das pessoas que usam o HCM são de opinião de que o hospital
presta “bons serviços”, entre opções como bom, mau e péssimo.
Desconfiados de que estávamos equivocados na leitura dos gráficos,
pedimos ajuda a uma enfermeira para que dissipasse o possível equívoco.
Para nosso espanto ouvimos: “Está a ler bem. É isso mesmo. Mais de 90
porcento das pessoas acham que o HCM presta bons serviços”. Não
acreditamos, muito em função do que andamos a ouvir dos doentes e a
avaliação popular. Levámos a dúvida do “índice de satisfação” ao
director Clínico que confirmou a leitura dos 90 porcento de índice de
satisfação. Questionámos o paradoxo existente entre a opinião pública e
os números internos e a explicação não podia ser mais interessante: “Nós
vivemos num País pobre e quando garantimos a refeição para as pessoas
já é muito para elas”, disse Diogo. Questionámos sobre a rigorosidade
dos critérios internos de avaliação e não tivemos resposta objectiva. (Matias Guente)
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