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VOA News: África

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Urgente revisão profunda do quadro legal anti-corrupção em Moçambique

...Segundo o CIP


Maputo(Canal de Moçambique) - O Governo e a Assembleia da República, em colaboração com as demais forças vivas da sociedade, devem trabalhar urgentemente com o objectivo de se melhorar o quadro legal anti-corrupção em Moçambique, eliminando-se as diversas lacunas existente e iniciar-se finalmente a implementação das convenções internacionais que o país assinou sobre a matéria. O CIP concluiu recentemente um relatório que analisa a legislação anti-corrupção nos seus aspectos preventivos e penais e identifica oportunidades para prática de actos de corrupção criadas por alguns diplomas legais. O CIP constata que existem zonas de penumbra cuja falta de regulamentação pode propiciar a ocorrência de práticas de corrupção.
Outro grande problema da legislação moçambicana tem a ver com o seu completo desajustamento relativamente às Convenções Internacionais. Neste desajustamento, a questão do desvio de fundos assume uma relevância particular uma vez que, diferentemente da legislação moçambicana, as convenções consideram essa prática como um crime de corrupção.
A existência de um bom quadro regulatório é fundamental para alavancar as políticas de reforma nesta área (como a Estratégia Anti-Corrupção, aprovada pelo Governo em 2006). Uma boa legislação é necessária para a regulação das relações sócio-políticas dentro do Estado, moldando significativamente a forma como a classe política e os funcionários públicos fazem a gestão do bem público.


Resumo dos aspectos críticos identificados
Regulação de conflito de interesses para membros do executivo.
A regulação do conflito de interesses para os membros do Governo é limitada; não tem efeito sobre o período pós-executivo. Isto permite que um membro do Governo faça do seu período de exercício do cargo público uma fase para procurar emprego ou firmar negócios com efeito no período pós-exercício. A lei não impede que um ministro se empregue num projecto que ele próprio criou ou facilitou, depois de deixar o cargo ministerial. Ou de tornar-se accionista ou funcionário executivo de uma empresa que ele próprio licenciou ou privatizou. Esta permissividade pode afectar de maneira substancial na motivação ministerial, uma vez que proporciona um forte incentivo para o governante intervir em situações susceptíveis de gerar para si oportunidade de emprego no período pós-executivo. Encontramos muitas zonas de penumbra que não estão devidamente regulamentadas em sede de conflito de interesses e que podem constituir janelas de oportunidade para a prática de crimes de
corrupcao:


• Não encontramos nenhuma norma que impeça o titular de cargo público de exercer actividade conexa com a sua anterior função, durante certo lapso de tempo;
• Não se proíbe que os antigos titulares de cargos públicos utilizem informações que tiveram acesso em virtude do exercício do seu cargo;
• Não encontramos normas que impeçam o titular de cargo público de aceitar o cargo de administrador ou conselheiro ou estabelecer vínculo profissional com pessoa física ou jurídica que desempenhe actividade relacionada com a área de competência do cargo ou emprego que ocupara;
• O Estado não tem mecanismo de fiscalizar e controlar a ocorrência de situações de conflito de interesses (incluindo os interesses empresariais do Presidente da República);
• Não há regras que impeçam que altos funcionários do Governo acumulem funções de administração em empresas sobre as quais tem poderes regulamentares-fiscalizadores
(recentemente, a Directora Nacional de Energia, Deolinda Cintura, foi nomeada administradora da Petromoc);
• Não encontramos normas que proíbam os titulares de cargos governativos de participarem em decisões que envolvam a contratação de empresas em que tenham tido alguma percentagem ou em que tenham sido membros dos órgãos sociais;
Regulação de conflito de interesses para membros do legislativo Em relação aos órgãos do poder legislativo, a legislação é completamente omissa no que se refere a eventuais conflitos que possam existir entre a função de deputado e os interesses das pessoas eleitas para esse cargo. O Estatuto do Deputado (Lei n.º 3-2004), que vai ser debatido na presente sessão da Assembleia da República, é omisso quanto à regulação de conflito de interesses para deputados.
Os deputados da AR não são obrigados a declararem, aquando da discussão de uma determinada lei, que têm interesses em relação à matéria em discussão; a lei não os impede de exercerem cargos de direcção em empresas púbicas, concessionárias de serviços públicos ou participadas pelo Estado (um caso recente é o da nomeação do deputado Mateus Kathupa para o cargo de Presidente do Conselho de Admnistração da Petromoc).
Em Moçambique não há regras de conflito de interesse que acautelem quaisquer oportunismos por parte de deputados da AR. Os deputados da AR podem ter, ao mesmo tempo, participações em empresas e votarem leis que lhes beneficiem. Ou seja, a legislação não regula o conflito de interesses de parlamentares em relação ao sector privado: os deputados podem servir interesses sem restrições; não há impedimentos ou condicionamento à ocupação por estes de cargos de confiança em empresas privadas, incluindo em lugares de Administração.
O deputado pode dirigir ou ser membro de uma comissão que estuda e elabora uma lei susceptível de ter efeito sobre uma empresa de que é responsável; isto será ainda mais grave se o deputado em questão representar uma empresa que, ainda que moçambicana, seja dominada por capitais estrangeiros (muitos deputados da AR exercem funções de administração em empresas privadas e são reputados advogados na praça).
A lei também não dispõe de nenhum mecanismo que impeça que o deputado faça "lobbies" para adiar ou impedir a aprovação de uma Lei, ou assegurar que a Lei seja elaborada de modo a não ferir os interesses da sua empresa.
Em nenhuma parte da legislação nacional encontramos normas que impeçam o deputado de:
• Ser membro de órgãos sociais de empresas públicas, de empresas de capitais públicos ou maioritariamente participadas pelo Estado e de institutos públicos;
• Exercer cargos de nomeação governamental sem autorização da Assembleia República;
• Tomar parte em contratos em cujo processo de formação intervenham órgãos ou serviços colocados sob sua influência directa.
Em Moçambique, o Estatuto do Deputado não obriga o deputado a declarar previamente a existência de interesse particular quando está em debate uma Lei que potencialmente lhe possa beneficiar directamente ou a pessoas que lhe sejam próximas, em negócios cuja
existência, validade ou efeitos se alterem em consequência directa da lei ou resolução da Assembleia da República.

Sobre a Declaração de Bens

Em relação à declaração de bens, o sistema de fiscalização é meramente formal, não havendo possibilidades para uma fiscalização incisiva sobre as mesmas, dadas as competências limitadas do Conselho Constitucional, as quais não permitem que este órgão faça uma fiscalização concreta das declarações. O depósito das declarações no CC é meramente emblemático. O CC nem tem sequer a prerrogativa de trocar informações com outras instituições, como por exemplo a Autoridade Tributária (AT), sobre os rendimentos auferidos por titulares de cargos públicos. O teor das declarações é marcado por muito "secretismo", o que não se compadece com a transparência que deve nortear a actividade administrativa do Estado. O nº 5 do artigo 7 da Lei n.º 7/98 estabelece que as declarações de bens estão cobertas pelas normas do segredo de justiça, sendo a sua divulgação indevida sancionada nos termos da Lei.


A publicidade das declarações de bens é um requisito de transparência em democracias modernas. Esse princípio permite que os cidadãos se defendam de determinados actos de corrupção que tenham lugar, por exemplo, nas suas municipalidades.

A protecção de denunciantes e testemunhas

Contrariamente ao que estabelecem as convenções internacionais, Moçambique ainda não tem mecanismos concretos de protecção de denunciantes e testemunhas. Na legislação moçambicana, a protecção de testemunhas não se encontra consagrada. A Lei 6/2004 (Lei Anti-corrupção) não estabelece mecanismos concretos de protecção.


A natureza da protecção de denunciantes inscrita na lei 6-2004 inscreve-se, "prima facie", na garantia do emprego do denunciante que, sendo funcionário do Estado, não pode ser sujeito a qualquer medida de carácter disciplinar ou mesmo ser deliberadamente prejudicado na sua carreira profissional em virtude de ter feito uma denúncia.. Em segundo lugar, a lei visa apenas proteger aqueles que, não sendo funcionários do Estado ou seus agentes, apresentem denúncias contra funcionários ou agente do Estado.


Oportunidades de Corrupção em Alguns Diplomas Legais.


Em Moçambique há oportunidades de corrupção oferecidas por alguns dos nossos diplomas legais. Estas oportunidades são criadas de várias formas e em leis que não são especialmente dedicadas à luta contra a corrupção; leis que têm por objectivo regulamentar vários aspectos da nossa vida, em especial a actividade financeira do Estado ou, em geral, a actividade económica.
No entanto, muitas vezes, essas leis, pela sua ambiguidade, disposições contraditórias, incongruências, lacunas, pela permissão excessiva advinda do poder discricionário que cabe na esfera jurídica de alguns órgãos do Estado ou pelas excepções criadas a certas proibições ou obrigações, criam oportunidades para a corrupção.

Vamos nos referir a três grandes grupos de casos:

O primeiro grupo respeita a leis que impõem o cumprimento de certas regras ou contêm proibições, mas, entretanto, contêm disposições legais que autorizam que aquelas regras não sejam cumpridas ou abrem excepções às proibições.
• O segundo grupo, muito próximo do primeiro, respeita a leis que concedem amplos poderes discricionários a um órgão ou agente da Administração Pública.
• O terceiro grupo respeita a leis que contêm disposições legais contraditórias ou ambíguas. Às vezes, estas disposições legais contraditórias ou, pelo menos, não harmonizadas, coexistem na mesma lei, outras vezes, constam de leis diferentes, mas relacionadas com o mesmo grande tema.

Limitações do Quadro Penal da Corrupção em Moçambique O crime de desvio de fundos
Lei n.° 1-79, de 11 de Janeiro (Lei sobre Desvio de Fundos do Estado) veio punir de forma especial o peculato, considerando-o como crime de desvio de bens do Estado e agravando as penas daqueles que, sem respeitarem os comandos legais sobre o destino a dar aos bens e dinheiros do Estado, os usarem em beneficio próprio ou alheio (n.º 1art. 1). Para além da pena a aplicar ao agente deste crime, a lei obriga ao confisco de bens a ele pertencentes para cobrir os prejuízos causados ao Estado (n.° 2 do art. 1).
Mas o crime de desvio de fundos, que ja constava do Código Penal, não é um crime de corrupção, contrariando o estipulado nas convenções internacionais que Moçambique assinou.Com efeito, o Protocolo da SADC contra a Corrupção, ratificado pelo Conselho de Ministros através da Resolução n.º 33-2004, a Convenção da União Africana Contra a Corrupção, ratificada pela AR através da Resolução n.º 30-2006, consideram o desvio de fundos como sendo um acto de corrupção. No mesmo sentido vai a Convenção das Nações Unidas Contra a Corrupção, que no seu artigo 17 prevê o desvio de fundos como sendo acto de corrupção.
Neste contexto, é urgente que o Governo moçambicano clarifique o que pretende quando promove a ratificação de protocolos e convenções internacionais, pois nos termos do nº 2 do artigo 18 da

CRM, os instrumentos jurídicos internacionais têm o valor jurídico dos actos normativos emanados da AR e do Governo. É necessário que se clarifique até que ponto as Convenções Internacionais que estabelecem como actos de corrupção o desvio de fundos, o tráfico de influências, o enriquecimento ilícito, o branqueamento dos proventos da corrupção, a obstrução da justiça, são de per si aplicáveis a casos concretos.
A definição operacional de corrupção não deve ser limitada a um ou dois tipos de crime configurados no código penal. A corrupção, enquanto fenómeno social é sempre mais dinâmica do que a sua criminalização.

Recomendações

O CIP considera ser urgentíssima uma revisão profunda da Lei Anti-Corrupção e do seu regulamento, tendo em conta as suas insuficiências e deficiências, que são do conhecimento público. Esta revisão seria igualmente um primeiro passo no processo de revisão da legislação anti-corrupção em geral. O que deve ser mudado na Lei Anti-Corrupção e seu regulamento: Os aspectos a tratar na revisão da Lei 6-2004, são, em princípio, os seguintes:

• A definição dos assuntos que deverão ser tratados na Lei contra a Corrupção e eventual elaboração de novos diplomas legais para os assuntos que devam ser retirados da Lei contra a Corrupção (por exemplo, se a regulamentação do GCCC deverá ser autonomizada numa Lei Autónoma; se a cláusula contratual anti-corrupção e a obrigatoriedade de fundamentação dos actos administrativos deverão passar a ficar integrados no Decreto n.º54-2005, de 13 de Dezembro (lei do "procurement") e no Decreto n.º 30/2001 (que aprovou as Normas de Funcionamento dos Serviços de Administração Pública, que já trata desta obrigatoriedade);
• A definição dos crimes a serem tratados por esta lei (por exemplo, o peculato, mais conhecido por desvio de fundos do Estado, é crime de corrupção em todo o mundo e está previsto nas Convenções Internacionais ratificadas por Moçambique);
• A compatibilização da Lei com os crimes já previstos noutros diplomas legais, em especial o Código Penal, e a criação de novos tipos legais de crimes – por exemplo, o tráfico de influências;
• A natureza jurídica, composição e consequentes poderes e procedimentos do GCCC;
• A compatibilização de assuntos tratados nesta Lei, mas já também tratados noutros diplomas legais, tal como, por exemplo, a "Declaração de Bens", seu depósito e fiscalização;
• A regulamentação da "protecção de denunciantes e testemunhas" para que o Estado apresente medidas administrativas dessa protecção e viabilize a relação do público com o GCCC.
O que o Governo e a AR devem ter em conta como aspectos cuja regulamentação é urgente para que possamos ter em Moçambique um quadro regulatório anticorrupção compreensivo e actualizado:
• Revisão da legislação sobre o conflito de interesses para membros do executivo, introduzindo-se quarentenas e impedimentos ao nível da contratação pública;
• Introdução no Estatuto do Deputado de impedimentos durante o exercício da sua função e finda a mesma, durante certo lapso de tempo;
• Aprovar um Código de Conduta geral e outros sectoriais para a Função Pública, e a criação de um sistema para garantir o cumprimento e monitoramento destas normas (sistema de gestão de ética pública);
• Definir com clareza ao nível da legislação o crime de enriquecimento ilícito e indicar as práticas que a este se ligam;
• Introduzir do tipo legal de crime de tráfico de influências, de corrupção no sector privado e de corrupção de funcionário público estrangeiro;
• Consagrar de forma mais substancial a protecção dos denunciantes no âmbito dos crimes previstos na lei anti-corrupção e na legislação geral que trata deste tipo legal de crime;
• Introduzir na Lei Anti-Corrupção matéria relacionada com a protecção das testemunhas.
Quanto a existência de um conjunto de excepções legais que derrogam a regra geral, proporcionando poderes discricionários aos centros decisores, os quais podem ser usados para a tomada de decisões ilegais a coberto da legalidade, sugerimos o seguinte:
• Que cada Ministério reveja a legislação que regula a sua área de actividade de forma a identificar as lacunas, as contradições, a ambiguidade, o poder discricionário concedido ao órgão decisor e a verdadeira necessidade de certas autorizações ou até proibições serem alteradas.
• Que a elaboração das leis seja mais cuidadosa, com a verificação de toda a legislação referente ao mesmo assunto, que tenha influência sobre o mesmo ou que seja influenciada pelo novo diploma legal, de forma a tentar evitar-se as incongruências, lacunas e, em geral, as falhas legislativas que criam oportunidades de corrupção. (Centro de Integridade Publica)


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