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VOA News: África

segunda-feira, 30 de julho de 2007

Sofrimento como paradigma de identificação

Os processos de invenção de identidades colectivas buscam do património de sofrimento a sua legitimidade para se afirmarem, disse o escritor Mia Couto, dissertando sobre “A Literatura e a Invenção da Identidade", numa palestra quarta-feira realizada na cidade de Maputo.
Como que a fundamentar a sua constatação, Mia Couto referiu-se a vários exemplos, com destaque para o seu ingresso na FRELIMO.Nos momentos imediatamente após a independência, conta que sentiu a necessidade de se candidatar a membro da FRELIMO. O processo de candidatura, segundo ele, decorria de uma maneira muito curiosa, pois que acontecia numa sessão pública e quem se candidatasse tinha que fazer a defesa pública da sua candidatura e passar por uma espécie de crivo onde era avaliado.
A defesa pública não era nada mais que uma “narração de sofrimento”, “e os que me antecederam realmente contaram histórias terríveis das suas vidas, eram pessoas que tinham sofrido na pele o racismo, a discriminação, a miséria, coisas que eu não tinham afectado a mim”. Prossegue afirmando que entrou em pânico, imaginou uma reprovação justamente porque o sofrimento era um atestado de ingresso e “eu era privilegiado, vinha da outra raça, eu era uma espécie de filho do sistema".
Não precisou de inventar e, quando chegou a sua vez, disse que “eu sofrí com o sofrimento dos outros e que essa dor que era uma dor emprestada não era de facto uma dor menor que a dor real dos outros que sofriam. Passei do teste e fui admitido". Observa que quando invocamos o sofrimento marcamos uma fronteira entre nós que sofremos e os outros que nos fizeram sofrer. “A ideia é: sofremos juntos, então somos irmãos; o passado é uma ferida comum, então partilhamos o mesmo presente". Aos olhos do escritor, esta dicotomia - sofrimento e vitimação - é um processo mental muito simplista, perigoso muitas vezes porque não pergunta, não questiona e não requere análise.
Continua afirmando que o paradigma sofrimento faz, não raras vezes, um apelo para que haja legitimidade para que os “outros" sofram, situação que faz emergir aquilo que chama de sentimento mais primário da humanidade, o desejo de vingança que, por sua vez, cria uma possibilidade de manipulação.“Essa possibilidade de manipulação tem sido, a meu ver, um dos principais instrumentos que as elites africanas usam para dominar os seus povos. A operação consiste em criar uma identidade, por exemplo, nós somos os ruandeses. E os outros nem é preciso nomear, sabemos quem são os outros.
Às vezes, é preciso criar esses outros”, disse.Num outro desenvolvimento, Mia Couto enalteceu o papel desempenhado por poetas e escritores no processo de libertação de África.“Craveirinha é um nome que não pode ser esquecido nem da história nem da literatura deste país, porque o próprio Eduardo Mondlane, que é o fundador da nação moçambicana, revela no seu livro 'Lutar por Moçambique' que foram os textos de José Craveirinha que ensinaram muitos dos nacionalistas a verificarem que há uma voz, há um rosto que se chama Moçambique. O poeta mostrou uma nação antes dela existir”, apontou.
Fonte: SAVANA

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