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VOA News: África

sexta-feira, 27 de julho de 2007

Mia Couto nega existência de uma identidade cultural

Mia Couto, explicou numa palestra, em Maputo, que nunca se pode pensar que existe uma identidade cultural que seja tipicamente moçambicana porque, por sua natureza, as identidades são de carácter dinâmico e sempre há espaço para diversas manifestações culturais de um povo.

`As identidades são sempre múltiplas, quase sempre são misturadas. Não devemos ter medo de as misturar e não devemos estar à procura de pureza quando falamos de identidades´. Esta intervenção vem numa altura em que se fala de crise de identidade cultural em Moçambique. Quando se entra no campo da música, a velha geração procura quase sempre reduzir a actual produção musical à insignificância.

Mia Couto afirma que não existe identidade, mas sim identidades, afirmação que nos remete à sua obra ´Cada Homem é uma Raça´, de 1990, em que João Passarinheiro, personagem principal, é inquirido por um polícia que o pergunta: qual é a sua raça? Ao que Passarinheiro responde simplesmente que `a minha raça sou eu mesmo. A pessoa humana é uma identidade individual. Cada homem é uma raça, senhor polícia´.

Afirma que as identidades são sempre híbridas. Quando se diz que sou moçambicano, sou desta etnia, por exemplo, não existe alguém que seja só puramente dessa etnia, cultura ou nacionalidade, do ponto de vista de definição de cultura, daquilo que é a marca de uma cultura como sinal de identidade moçambicana. `Somos produto de várias misturas que se foram fazendo, e ainda bem que ninguém é puro, porque é em nome da pureza que quase sempre se fizeram os massacres, as exclusões dos outros. Existem identidades, mas elas não são estáticas. A identidade é uma coisa que muda no tempo, dentro de nós próprios e, portanto, não é uma verdade pura e imutável´. `A identidade de um povo é feita por um somatório de identidades individuais, colectivas, religiosa, de grupos, de raças, etc. É muito difícil dizer que um moçambicano é assim religiosamente. Um moçambicano é católico? Muçulmano? Tem religião dos antepassados? Ou é tudo isso misturado? A ideia é que a identidade é uma moldura, mas essa moldura tem que dar espaço a diversidades. Portanto, quando falamos de uma identidade temos que falar sempre no plural, porque se estou à procura de uma identidade pura vou cair sempre no erro´.

`No que concerne a música, esta passa por este mesmo cozinhado; é uma sopa que se faz, que tem raízes e que se devem encontrar com a terra, com as tradições, com o passado, com tradições, e depois a maneira como se cria um caldo cultural em que as coisas são capazes de se misturar´. `Os grandes povos que são exportadores de música fizeram isso muito bem. O Brasil, por exemplo, é um país de exportação de música de grande qualidade, fez isso porque foi capaz de misturar coisas diferentes; Cabo Verde é outro exemplo, é um país que exporta música de grande qualidade, porque se tornou uma espécie de uma misturadora´. `Acho que tem que existir espaço para todos os géneros musicais e é preciso criar várias `escolas musicais´ dentro do país. Alguns deles por serem nossos e porque temos originalidade, sabemos que têm o carimbo moçambicano, e a marrabenta é um desses ritmos que tem toda a condição para sair de Moçambique e impor-se no mundo. Implica que alguém tem que trabalhar na qualidade, numa condição de saber que lá fora isso tem que ser vestido de uma certa maneira´, salientou.


fonte: O País

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