AR aprovou-o na generalidade, mas…
A
festa continua: os deputados que acumulam cargos de administradores ou
Presidentes do Conselho de Administração (PCAs) de empresas geridas ou
participadas pelo Estado levarão seus mandatos até ao fim. Só depois de
legalmente cumpridos os seus mandatos em curso nas empresas públicas é
que serão abrangidos pela Lei. A Comissão dos Assuntos Constitucionais,
Direitos Humanos e de Legalidade propôs que esta lei seja chamada por
“Lei de Probidade Pública”.
Maputo
(Canalmoz) - Depois de muita resistência a bancada parlamentar da
Frelimo acabou por ceder. A Assembleia da República debateu e aprovou,
ontem, quarta-feira, por consenso, o Código de Ética do Servidor
Público, instrumento que faz parte do chamado pacote anti-corrupção. Uma
fonte sénior da bancada parlamentar da Frelimo disse ao Canalmoz que o
seu grupo parlamentar só aceitou levar o Código de Ética a debate com a
condição de o mesmo não ter efeitos imediatos, caso seja aprovado e
cumpridos os 90 dias para sua entrada em vigor. Isso porque aquele
instrumento proíbe os deputados de, ao mesmo tempo, serem
administradores ou PCAs das empresas públicas. E foi o que aconteceu.
Como
os deputados da bancada da Frelimo são os campeões da acumulação de
cargos públicos, num paradoxo a todos os títulos estranho, só aceitaram
debater a Lei, com a condição de concluírem os seus mandatos nas
empresas onde acumulam cargos de administradores. Assim nenhum deputado
vai perder “o tacho” nas empresas públicas até terminarem os mandatos
que estão a exercer agora.
O que diz a proposta do Código de Servidor Público?
Para
acabar com esta situação a proposta da UTREL prevê uma série de medidas
que, a serem aprovadas pelo Parlamento, acabam com um conjunto de
questões caricatas em que estão abrangidos alguns deputados. Nalguns
casos são juízes em causa própria.
Por
exemplo, a proposta prevê que passe a ser proibido receber remunerações
de outras instituições públicas ou de empresas que tenham participação
do Estado, seja em forma de salário, senhas de presença ou honorários.
Esta proibição não se aplica quando as remunerações provêm do exercício
da docência em estabelecimentos de ensino públicos, nem os que resultem
de fazer parte de delegação oficial, assim como as que advenham do
desempenho de cargos em instituições de beneficência.
Aos
deputados está ainda previsto que passe a ser igualmente vedada a
possibilidade de celebrar directa ou indirectamente, ou por
representação, contrato com a administração pública ou autárquica ou com
empresas que tenham participação do Estado.
Neste
aspecto, entende-se que contrata em forma indirecta quando alguns
desses cargos nas empresas co-contratantes do Estado sejam desempenhadas
pelo cônjuge, irmão, ascendente ou descendente do deputado em qualquer
grau da linha recta.
Implicados directos
Não
é por acaso que há um braço-de-ferro entre o Parlamento e a UTREL. É
que caso seja aprovada a proposta do Código de Ética do Servidor
Público, muitos deputados com poderes de decisão a nível do partido e da
bancada da Frelimo terão de escolher entre ganhar no Empresas Públicas
ou no Parlamento. Sendo ainda que a acumulação destes cargos impede a
justiça de agir de imediato sobre eles em caso de irregularidade por
beneficiarem de imunidade como deputados.
Deputados
como Margarida Talapa (administradora da mCel); Manuel Tomé
(administrador da HCB), Edson Macuácua (administrador da Empresa
Nacional de Hidrocarbonetos - ENH); Mateus Katupha (PCA da Petromoc);
Isidora Faztudo (PCA da Cervejas de Moçambique); Teodoro Waty (PCA das
Linhas Aéreas de Moçambique); Virgília Matabele (vice presidente do
Instituto Nacional de Turismo); Casimiro Waty (PCA do Fundo de Fomento
do Ambiente), entre outros, deixarão de poder acumular cargos. Todos
eles ocupam algtos cargos no Parlamento para além de serem deputados.
São
mais bizarros os casos do deputado Casimiro Waty e Virgília Matabele
que têm a particularidade de serem subordinados directos dos ministros
do Ambiente e Turismo, entidades a quem deviam fiscalizar na qualidade
de deputados da Assembleia da República.
E
mais: ainda à luz do projecto da UTREL os deputados estarão impedidos,
em seu nome ou de empresas por eles participadas, de se apresentarem em
concursos promovidos pela administração pública ou por autarquias.
Argumento da Frelimo
Todas
as comissões emitiram pareceres favoráveis à aprovação da Lei, mas com a
condição de a mesma ter efeitos depois de cumpridos os mandatos, devido
a alegados princípios de Direito. Todas as comissões afirmam que “tendo
em conta os princípios de segurança e estabilidade entendemos que as
situações jurídicas constituídas anteriormente não devem ser
prejudicadas pela Lei que se pretende aprovar porque defendemos o
princípio de que as Leis não devem ter efeitos retroactivos”. Ou seja,
caso seja aprovada a Lei, os deputados que são administradores nas
empresas públicas continuarão a acumular as suas funções até o fim do
mandato sem possibilidade de renovação em uma das funções, ou nas
empresas ou como deputados.
Lei de Probidade Pública ao invés de Código de Ética
A
Comissão dos Assuntos Constitucionais, Direitos Humanos e da Legalidade
propõe que a lei tenha uma amplitude maior de tal modo que em vez de ser
uma lei de ética do servidor público passasse a ser uma Lei de
Probidade Pública, “para ficar claro que não se trata apenas de uma
questão deontológica mas também uma questão moral. A lei devia ser mais
abrangente e não cingir-se apenas aos deputados e aos magistrados, pois o
que se pretende é uma moralidade pública”.
Ministra da Justiça não comenta
O
Canalmoz contactou a ministra da Justiça, Benvinda Levi, para comentar
sobre a aplicação da Lei só depois de os deputados terem cumprido os
mandatos nas empresas públicas. Levi preferiu não comentar: “não tenho
nada a comentar sobre esse assunto”. (Matias Guente)
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