Surpreendentes  revelações? Só para quem está distraído. Há dias, escrevi sobre as  actividades da máfia. Escrevi que os primeiros sinais da existência de  uma rede de máfia e do branqueamento de capitais, em qualquer canto do  mundo, consistem no volume de dinheiro que circula em determinadas  áreas, sem que justifiquem o nível do desenvolvimento económico desse  país. As principais fontes de renda destes grupos são o tráfico de  droga, de armas, o jogo, fraudes em serviços e obras públicas, lavagem  de dinheiro, etc. Os membros da máfia são conhecidos como homens de  honra.
 A  máfia é constituída por organizações precisas, por homens, dinheiro,  relações políticas, alianças com outros componentes sociais, tráficos  criminosos. Tais organizações mafiosas, diferentemente das organizações  criminais comuns, além de serem fundadas sobre uma estrutura interna de  carácter hierárquico, sobre a programação permanente de acções  delituosas, sobre a guarda de sigilo das relações internas, sobre o  reinvestimento dos ganhos ilícitos, e, além de lançar mão, para se  impor, da violência e do logro da corrupção e da intimidação, exercem um  profundo controlo do território, inserem-se, através de actividades  empresariais e investimentos aparentemente lícitos, na sociedade,  entrelaçando relações com o mundo legal e, em particular, com sectores  do mundo político-financeiro.
Ontem,  o polémico site Wikileaks publicou telegramas confidenciais da  embaixada norte-americana em Maputo, nos quais se revela que “em  Moçambique, o poder político ao mais alto nível está comprometido com o  narcotráfico. O narcotráfico tem uma base segura em Moçambique, rota da  cocaína que chega do Brasil, do haxixe do Paquistão e da heroína  produzida no Afeganistão”, afirmam diplomatas americanos. Mais,  revela-se nesses telegramas que “após Guiné-Bissau, Moçambique tornou-se  a segunda praça africana mais activa no trânsito de narcóticos.  Moçambique não é um completo narco-Estado corrupto, mas segue numa  direcção inquietante”, destaca o encarregado de Negócios da embaixada  dos EUA em Maputo.  “(...)MBS tem laços directos com  dirigentes da Frelimo”, revela um telegrama diplomático de 28 de  Setembro de 2009, realçando que “Selemane contribuiu em grande parte  para financiar a Frelimo (partido do governo) e ajudou  significativamente nas campanhas eleitorais dos candidatos da Frelimo”. 
Não  digo que os americanos estão certos ou errados. Mas, eu nunca duvidei  que este país tivesse uma estrutura financeira suportada pelo  narcotráfico. Nunca duvidei que este país fosse um campo de lavagem de  dinheiro proveniente de tráfico. Igualmente, nunca duvidei que este país  fosse um corredor, armazém e entreposto de drogas.  Também  nunca duvidei que algumas figuras do nosso país estivessem a servir-se  de narcotráfico para enriquecerem. E, por enquanto, não duvido que os  nossos corredores de desenvolvimento e a nossa costa marítima servirão  de túneis de passagem de drogas, enquanto o narcotráfico continuar a ser  visto pelo nosso governo como benéfico para a nossa almofada  financeira.  Os bancos, as casas de câmbio e outras  instituições financeiras continuarão, no futuro, a crescer rapidamente  em quantidade, além de anualmente apresentarem lucros fabulosos. O  dinheiro movimentado aqui não é proporcional ao nível do desenvolvimento  do país. Uma das características de países suportados pelo dinheiro de  narcotráfico é o volume de investimento que recebem na área imobiliária,  sobretudo de hotéis, centros comerciais, casinos  e outras actividades.
O  que deixou claro que alguns dos nossos governantes estavam  comprometidos com o narcotráfico foi a forma como o Governo se bateu em  defesa da imagem de Momed Bachir, quando o Departamento do Tesouro dos  EUA o declarou barão de droga. Foi duro ouvir o ministro do Interior, na  altura, José Pacheco, a dizer, com propriedade, que “Bachir tem ficha  limpa”, ainda que soubesse que tinha tido problemas em Nampula e na  Suazilândia. Ouvir declarações desta natureza de um ministro que, em  condições normais, deveria ordenar que se investigasse o acusado com  vista a apurar a veracidade da acusação americanas, foi, não só  frustrante quanto perturbante, como também revelador do compromisso  político do Governo com o narcotráfico. Se o Governo defende que Bachir é  limpo, isso significa que o conhece muito bem, desde os contornos dos  seus negócios até aos movimentos que ele faz. Ora, para o conhecer bem é  preciso também estar inserido no seu meio social e de negócios. Aliás,  as declarações de Pacheco indiciavam que não havia condições para se  investigar o acusado, por sinal, um dos principais financiadores das  campanhas da Frelimo e dos seus candidatos. E se a Frelimo recebe  dinheiro de indivíduos sem questionar a sua proveniência, também tem a  obrigação moral de os defender sem duvidar dos seus ficheiros. Verdade  ou não, a máfia controla o sistema financeiro e político nacionais.
Há  dias recebi a informação segundo a qual a cocaína apreendida  recentemente em Portugal, cujo destino era Moçambique, era de um dos  donos de uma série de hotéis nacionais, dos quais alguns inaugurados  pelo Chefe do Estado. Por acaso já reflectiram por que razão Momed  Khalid Ayoob transportou, ilegalmente, 18 milhões de randes (cerca de 3  milhões de dólares) de Moçambique para Suazilândia sem os declarar? Se o  dinheiro é de actividades lícitas, por que não o declarou?
 
 

 
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