O “tsunami” político e social que se vive nesses países do norte de África não é circunscrito. A turbulência pode alastrar a outros países e regiões.
Alfredo Prado*
Durante anos, os governos dos países desenvolvidos procuraram impingir aos países pobres e em desenvolvimento as teorias do neoliberalismo. As elites locais acolheram-nas de braços abertos. Os resultados já estão à vista. Mas não são, certamente, os que os arautos da doutrina esperavam. A economia dos EUA quase foi ao tapete e a velha Europa paga com altos juros o preço desse liberalismo.
As realidades africanas são política e culturalmente muito diferenciadas e falar do continente como um todo pode ser um exercício pouco objectivo. No entanto, muitas dessas realidades, como a pobreza, o atraso tecnológico e os poderes autocráticos e autoritários, são ainda um denominador comum a muitos dos países.
As realidades africanas são política e culturalmente muito diferenciadas e falar do continente como um todo pode ser um exercício pouco objectivo. No entanto, muitas dessas realidades, como a pobreza, o atraso tecnológico e os poderes autocráticos e autoritários, são ainda um denominador comum a muitos dos países.
Os recentes acontecimentos na Tunísia e no Egipto e os sobressaltos que já se fazem sentir em países vizinhos como o Iémen, a Argélia ou até a Jordânia, evidenciam o esgotamento dos modelos autocráticos que se procuram perpetuar no poder. Os Ben Ali da Tunísia ou os Mubarak do Egipto parecem estar condenados.
Os “campeões” das chamadas democracias ocidentais, como os Estados Unidos ou a União Europeia, surgem agora a anunciar receitas e a mostrar surpresa com as revoltas que estalaram nesses países, que podem transformar a região num autêntico barril de pólvora. Na realidade, é conhecido que regimes como os da Tunísia e do Egipto só se mantiveram até hoje graças aos apoios desses países. Que obviamente não ignoravam o autoritarismo, as perseguições políticas aos adversários, as câmaras de tortura dos serviços secretos, os gigantescos desequilíbrios sociais, a corrupção, os desmandos das elites no poder.
O “tsunami” político e social que se vive nesses países do norte de África não é circunscrito. A turbulência pode alastrar a outros países e regiões, ainda que se saiba quão profundas são as diferenças políticas, culturais e religiosas entre os países do norte do continente e os que ficam a sul do Sahara.
Na época da Internet as fronteiras diluem-se. Hoje, nem a tecnologia chinesa, nem os computadores do Pentágono ou da Cia conseguem impedir a circulação de informação à escala planetária. Que o diga a Casa Branca a braços com o Wikileaks.
A revolta popular, que no início de Setembro do ano passado saiu às ruas de Maputo, contra a alta de preços de alguns bens essenciais, evidenciou o início do esgotamento da capacidade de sofrimento dos cidadãos, em Moçambique e em muitos países onde a avidez das elites locais se confronta com a pobreza e falta de esperança da esmagadora maioria das populações. Na capital moçambicana pelo menos dezoito pessoas morreram e centenas ficaram feridas.
A FAO tem vindo a alertar, há já alguns anos, para o aumento do custo dos alimentos. O secretário executivo da SADC-Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral, Tomaz Salomão, lembra que na Tunísia os protestos começaram pelo preço do pão, no Egipto pela falta de emprego. "Na realidade o fenómeno vai propagar-se e vão resistir os países que têm arcaboiço de aguentar, nos que não têm não fiquemos surpreendidos de ver repetições de fenómenos idênticos aos que aconteceram em Moçambique", diz.
As lutas a que assistimos hoje não colocam em causa apenas as políticas dos governos. Elas contestam os próprios regimes e sistemas. E nem sequer o atraso tecnológico em que se encontram ainda as populações de grande parte dos países da África subsaariana impedirá que idênticos “tsunamis”, de maior ou menor amplitude, alastrem pelo continente.
Não é necessário ter uma qualquer bola de cristal para prever que ou os governos e os detentores do poder têm capacidade de mudar os sistemas que criaram e lançam verdadeiros programas de combate aos desequilíbrios sociais ou a pobre África será palco de revoltas com conseqüências imprevisíveis.
Alfredo Prado, jornalista, é diretor dos portais África 21 Digital e Portugal Digital
Os “campeões” das chamadas democracias ocidentais, como os Estados Unidos ou a União Europeia, surgem agora a anunciar receitas e a mostrar surpresa com as revoltas que estalaram nesses países, que podem transformar a região num autêntico barril de pólvora. Na realidade, é conhecido que regimes como os da Tunísia e do Egipto só se mantiveram até hoje graças aos apoios desses países. Que obviamente não ignoravam o autoritarismo, as perseguições políticas aos adversários, as câmaras de tortura dos serviços secretos, os gigantescos desequilíbrios sociais, a corrupção, os desmandos das elites no poder.
O “tsunami” político e social que se vive nesses países do norte de África não é circunscrito. A turbulência pode alastrar a outros países e regiões, ainda que se saiba quão profundas são as diferenças políticas, culturais e religiosas entre os países do norte do continente e os que ficam a sul do Sahara.
Na época da Internet as fronteiras diluem-se. Hoje, nem a tecnologia chinesa, nem os computadores do Pentágono ou da Cia conseguem impedir a circulação de informação à escala planetária. Que o diga a Casa Branca a braços com o Wikileaks.
A revolta popular, que no início de Setembro do ano passado saiu às ruas de Maputo, contra a alta de preços de alguns bens essenciais, evidenciou o início do esgotamento da capacidade de sofrimento dos cidadãos, em Moçambique e em muitos países onde a avidez das elites locais se confronta com a pobreza e falta de esperança da esmagadora maioria das populações. Na capital moçambicana pelo menos dezoito pessoas morreram e centenas ficaram feridas.
A FAO tem vindo a alertar, há já alguns anos, para o aumento do custo dos alimentos. O secretário executivo da SADC-Comunidade para o Desenvolvimento da África Austral, Tomaz Salomão, lembra que na Tunísia os protestos começaram pelo preço do pão, no Egipto pela falta de emprego. "Na realidade o fenómeno vai propagar-se e vão resistir os países que têm arcaboiço de aguentar, nos que não têm não fiquemos surpreendidos de ver repetições de fenómenos idênticos aos que aconteceram em Moçambique", diz.
As lutas a que assistimos hoje não colocam em causa apenas as políticas dos governos. Elas contestam os próprios regimes e sistemas. E nem sequer o atraso tecnológico em que se encontram ainda as populações de grande parte dos países da África subsaariana impedirá que idênticos “tsunamis”, de maior ou menor amplitude, alastrem pelo continente.
Não é necessário ter uma qualquer bola de cristal para prever que ou os governos e os detentores do poder têm capacidade de mudar os sistemas que criaram e lançam verdadeiros programas de combate aos desequilíbrios sociais ou a pobre África será palco de revoltas com conseqüências imprevisíveis.
Alfredo Prado, jornalista, é diretor dos portais África 21 Digital e Portugal Digital
AFRICA21 – 08.02.2011
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