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quarta-feira, 2 de maio de 2012

Governo “Choramingão” e medíocre


Canal de Opinião
por Noé Nhantumbo


Corrupção, nepotismo, auto-protecção serão algumas das heranças deste governo…

Beira (Canalmoz) – Para alguém em fim de mandato compreende-se a preocupação em deixar algo para a história. Também não deixa de ser normal que uma liderança confrontada com um fardo pesado de tarefas se veja muitas vezes compelida a replicar às críticas de modo ou maneira pouco estudada ou pensada.
Quando quem governa mistura dossiers e sobrepõe interesses privados aos públicos, a coisa fica uma “salada russa” de verdade. As explicações apresentadas todos os dias para justificar o que o Governo não consegue fazer já atingiram o cúmulo do rídiculo.
Convém também dizer que há algumas obras concretizadas por este governo “choramingão”. Hás as visíveis e as menos visíveis. Devemos aplaudir. Mas quando qualquer análise mostra que o feito é muito menor do que o que deveria e podia ter feito e não fez, não se pode deixar de criticar o governo só porque o seu timoneiro é propenso a desagradar-se. Agora sabemos que quem “cunhou a frase “deixa andar” gosta pouco de ser chamuscado com o fogo da crítica.

Embora nos tempos dos comissários políticos fosse advogada a crítica e auto-crítica e promovida como forma de purificar fileiras, agora a história regista esta III República como a dos “choramingões”.
Quem não gosta ou não admite críticas dificilmente consegue conversar ou escutar os outros.
Num a situação de paz e estabilidade relativa, a tomada de decisões que afectam a todos deve passar pelo debate aberto.
A insensatez e alguma dose de teimosia levaram a que empresas públicas fossem largamente lesadas por alguns de gestores de topo. Numa atmosfera viciada pelo nepotismo e pelo encobrimento permanente de acções nefastas praticadas por membros de grupos fechados, tem-se visto recursos públicos serem desviados tanto para bolsos privados como para sustentar acções não previstas na lei.
Quando a comunicação social não se cansa de alertar, de forma até branda, para abusos e atropelos das normas estabelecidas, e da parte de quem governa não se vê resposta adequada e proporcional, essa atitude só pode merecer crítica e repúdio dos cidadãos.
É preciso que quem ocupa cargos governativos se compenetre de que tais funções não são sua propriedade. O cargo em si não é propriedade privada.
Entre o “deixa andar” e os choramingões há uma distância que convém desde já apurar para que não haja confusões e atribuição de créditos alheios.
O estado actual da governação em Moçambique é sem dúvida deficitário e isso é não só conjuntural como resultado de alguma incapacidade de determinar os caminhos que devem ser seguidos pelos governantes.
Se o ambiente financeiro e político internacional constituem uma dor de cabeça para quem governa isso não deveria ser motivo ou razão para a paralisação no que se refere à concepção e implementação de medidas apropriadas para enfrentar a crise.
Não se pode advogar o regresso às nacionalizações mas este governo precisa de deixar alguma herança palpável para as gerações vindouras. Não podemos ter como herança um conjunto de mega projectos pertencentes a outros ou “elefantes brancos” plantados um pouco por todo o país.
O êxito de alguns moçambicanos em demonstrarem capacidade de avançarem na área económica é de saudar.
Mas também deve haver coragem e capacidade de dizer abertamente que os êxitos de muitos dos moçambicanos apresentados como exemplos não passa de uma “cópia barata” de “quadros de artistas famosos”.
Praticamente não há empresa moçambicana que tenha sido criada e avançado através do trabalho e aplicação diligente de recursos privados. A maioria dos brilharetes empresariais tem sido feita à custa de tráfico de influência e de adjudicação de empreitadas sem concursos. Essa será sem dúvida uma das “marcas registadas” do actual governo.
“Capitalistas” gerados por fundos do Tesouro nacional e que constantemente tem acesso a recursos bancários sem que alguém pestaneje e se pergunte quando serão pagos obrigam-nos a pensar de onde vem afinal as suas fortunas. Essas “riquezas” não podem constituir exemplos porque são afinal “castelos feitos de areia”.
Não tem sido fácil governar um país tão grande como Moçambique de maneira centralizada. Toda a cadeia hierárquica estabelecida não possui autoridade nem meios efectivos para exercer suas funções. Tanto as limitações orçamentais como as directivas existentes, impedem que mesmo o mais diligente governante tenha êxito na sua acção.
Terá algum significado ou utilidade instituir a figura de inspector do estado quando este cargo é anulado pelas presidenciais abertas e inclusivas?
Não se pode falar de inexistência de recursos humanos com capacidade para desenhar e implementar planos de governarão adequados à realidade moçambicana. Em tempos muito mais difíceis, como uma postura diferente dos governantes, produziram-se resultados qualitativamente diferentes.
Os “comissários políticos” de hoje esqueceram-se rapidamente do que mobilizava e convencia as pessoas a darem o melhor de si por uma determinada causa.
A ameaça, o uso do temor como arma para coagir os funcionários a realizarem seu trabalho tem uma durabilidade reduzida. Logo que o chefe se ausenta nada se faz e o pouco que se faz é só para irem justificando o salário auferido.
Sem que o PR visite uma determinada localidade ou distrito quase certo que tal local se manterá parado no tempo. As estradas, pistas de aterragem, escolas, centros de saúde e outras infra-estruturas públicas recebem pinturas e são “envernizadas” por ocasião da visita do Presidente da República (PR), mas depois dele partir dividem-se as “comissões”, distribuem-se alguns dos meios adquiridos para suportar e apoiar a visita presidencial e os funcionários, cada um, passa a dedicar-se ao seu negócio privado.
Quem não sabe que o gado do fomento é desviado e dividido entre “os grandes da terra”?
Quem não sabe que as empresas de reparação ou manutenção de estradas terciárias são de membros do partido no poder escolhidos a dedo e que dividem comissões com gente bem posicionada na Autoridade Nacional de Estradas?
Se antes era o “deixa andar” hoje são as empresas que nascem como cogumelos para acudir as solicitações identificadas por titulares de cargos públicos de topo.
As falcatruas são tantas que mesmo uma equipa de ministros distraídos por vezes tem de acordar e mandar cessar fundões a este ou aquele PCA.
Sectores vitais como o da electricidade, foram como que entregues a “vampiros”. Mananciais de recursos, sistemas herdados da potência colonizadora, são inviabilizados para que alguém ganhe uma comissão choruda com a sua reabilitação. Montam-se sistemas fantasmas de procurement em que quem ganha as obras são sempre as mesmas empresas. E até a maior parte das vezes nem há concursos públicos. Já nem disfarçam.
Efectivamente o que se passou durante a III República foi uma ofensiva de enriquecimento ilícito por muitos dos detentores do poder.
A montagem do modelo de governação foi de tal forma rápida e eficiente que num abrir e fechar de olhos todos os representantes da II república foram retirados da cena e substituídos.
Neste terceira república, um pacote de instruções renovado passou a governar o país e todos rapidamente se adaptaram às exigências do novo poder.
Na febre de recuperar o tempo perdido até se perdeu alguma vergonha ao abocanharem-se recursos públicos para que vingassem agendas privadas. Hoje Moçambique está salpicado de iniciativas a que o governo pretende chamar de sinais de desenvolvimento, mas há muitas dúvidas se o que foi feito teria de facto prioridade sobre outras coisas mais necessárias à esmagadora maioria dos cidadãos.
Não se pode negar que algumas coisas aconteceram neste país. Mas da mesma maneira é preciso que se diga que muito ficou por fazer. A agenda dos governantes até pode estar bem escrita no papel mas a sua implementação é contrariada todos os dias pela maneira como estes mesmos governantes conduzem a máquina ao seu dispor. Num ambiente de impunidade total e de imunidade todos tem estado a “molhar o bico”.
Decerto que corrupção, nepotismo, autoprotecção serão algumas das heranças deste governo de “choramingões”… (Noé Nhantumbo)

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